domingo, 19 de abril de 2009

Vida familiar e carreira – Que resposta?

Retomo hoje o tema que abordei no post de 8 de Abril: vida familiar e carreira, tentando encontrar resposta para a questão que nele formulei.
O mundo do trabalho, tal como o conhecemos, é fruto de uma evolução secular, mas basicamente podemos dizer que foi organizado pelos homens e para os homens. Partiu do pressuposto da divisão da vida social em duas esferas distintas: a esfera privada da família e a esfera pública do trabalho, sendo a primeira o lugar onde a mulher exercia os papéis de mãe e de esposa, através dos quais provia à manutenção da espécie e do indivíduo (homem) ao qual assegurava as necessidades básicas de sobrevivência para que por sua vez pudesse florescer na esfera pública.
Neste contexto e libertos de cuidados demasiado prosaicos e rotineiros, os homens puderam dispensar boa parte da sua energia ao trabalho e à vida realmente produtiva dado que as tarefas reprodutivas e de subsistência ficavam praticamente entregues em exclusividade às mulheres.
Não vou falar aqui das consequências que resultaram desta divisão social. Vou concentrar a atenção no mundo do trabalho ao qual, lenta mas continuamente, as mulheres começaram a aceder e no qual vão encontrar inúmeras dificuldades a que os elementos masculinos são poupados.
Para além de outros aspectos, essas dificuldades, decorrentes do facto de a organização do trabalho ter sido masculina, tiveram como consequência restringir a liberdade das mulheres, levando-as a escolher profissões menos exigentes ou profissões que lhes permitissem uma melhor gestão do tempo, como é o caso, por exemplo, do Ensino que possibilita que muito trabalho seja feito em casa e fornece assim um enquadramento menos rígido e mais compatível com as tarefas domésticas. No caso de carreiras mais exigentes nas áreas, por exemplo, da política, administração empresarial ou finanças, é frequente as mulheres queixarem-se da existência de um «tecto de vidro», isto é, de obstáculos informais, não declarados nem visíveis, que não lhes permitem o acesso aos lugares de topo da carreira.
O mundo do trabalho tal como se apresenta é um mundo muito exigente em termos de disponibilidade e dispêndio de energia e justifica essa exigência pela necessidade de competitividade: é sempre preciso ser melhor do que os outros para produzir mais e melhor. Claro que este conceito de competitividade como estilo de vida é discutível, mas não o faremos aqui. O facto é que, para as mulheres que têm a seu cargo a organização da vida familiar, isso representa uma desvantagem real pois tornam-se, enquanto força de trabalho, menos competitivas que os seus colegas masculinos e por tal motivo são preteridas, ou ganham menos ou não chegam a lugar de topo.
A inversão desta situação passa por transformações profundas - não por mera cosmética, na vida familiar e na vida profissional. E para essas transformações têm de começar a caminhar-se em simultâneo porque umas não são possíveis sem as outras.
Quanto à vida familiar é preciso ir mais além da mera pretensão a que os homens ajudem nas tarefas domésticas, não é que essa ajuda não seja importante, mas é que ela é insuficiente. O conceito de ajuda implica sempre um papel secundário: os homens ajudam, mas o trabalho é delas… Ora é este modelo que é preciso começar a rejeitar: a responsabilidade pelas tarefas domésticas, cuidado dos filhos e/ou dos elementos mais idosos das famílias, é dos dois e deve ser igualmente repartida ou pelo menos tem de caminhar-se nesse sentido.
Na esfera profissional é preciso encontrar modelos mais flexíveis tanto para os homens como para as mulheres que permitam compatibilizar as suas responsabilidades profissionais com as responsabilidades domésticas. Uma dessas medidas deveria ser a de reduzir a jornada de trabalho. A situação actual em que vivemos, com índices preocupantes de desemprego que podem vir a provocar convulsões sociais, impunha regulamentação a promover pela Organização Mundial do Trabalho nesse sentido. Uma outra medida seria flexibilizar essa jornada de trabalho permitindo, por exemplo, o trabalho em casa sem a deslocação a escritórios ou outros locais - o que a Internet e os computadores já facilitam em muitas situações. Por outro lado, o aumento de lugares de boa qualidade onde as crianças possam desenvolver-se saudável e harmoniosamente seria um instrumento importante que se podia tomar a nível estatal ou de grandes empresas para ajudar as famílias.
Resumidamente podemos dizer que o que é preciso é alguma imaginação e vontade política para alterar as coisas. Mas as coisas só poderão ser alteradas se:
(1) Os homens também começarem a sentir as pressões que as mulheres actualmente experimentam nas suas tentativas de conciliação entre vida familiar e profissional;
(2) As mulheres cooperarem em força no campo legislativo ocupando cargos políticos que permitam intervenção efectiva.

As mudanças na vida familiar e na vida profissional, caminhando em paralelo, reforçar-se-ão mutuamente. Isto no curto prazo, penso, é o que se pode fazer.

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